quinta-feira, 11 de abril de 2013

Sobre a decisão do Tribunal Constitucional

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Não me passa pela cabeça considerar que algum dos membros – um só que seja! – do Tribunal Constitucional se caracterize por inaptidão intelectual, falta de experiência, visível limitação de conhecimentos, incapacidade de trabalho sistemático e sistémico. Em suma, reconheço a todos os membros do Tribunal Constitucional a necessária e adequada competência para o exercício de tal elevado quanto exigente cargo.

Deste reconhecimento deriva um outro, qual seja o de as suas decisões serem tomadas conscientemente.

E, porque competentes para o desempenho do cargo, o exercem de modo consciente, uma inevitável consequência se infere: são responsáveis pelas decisões que tomam.

A recente decisão do Tribunal Constitucional sobre o Orçamento de Estado para 2013, é, pois, uma decisão de que todos os seus membros são responsáveis.

E não responsáveis por quê? São responsáveis por:

1. “Constitucionalizarem” a prática do roubo. De facto, as pensões pagas a aposentados, pensionistas e reformados não são despesa do Estado, mas sim o retorno do investimento feito pelos trabalhadores (do sector público ou do sector privado), através dos descontos efectuados ao longo de uma vida (dezenas de anos, no meu caso mais de 47 anos!), por forma a garantirem uma velhice digna, e no âmbito de um contracto estabelecido (melhor, imposto!) pelo Estado, com que este se comprometia (comigo, o compromisso assumido pelo Estado tem mais de 47 anos de rigoroso cumprimento da minha parte!), ao pagamento dessa pensão a partir do acto da reforma ou da aposentação.

Se já é absolutamente reprovável uma diminuição dos salários dos trabalhadores (públicos ou privados), comparar pensões de reforma a salários de quem está no activo, não passa de ludibriar semanticamente a lei, num exercício de espertismo pacóvio, triste, mesquinho, rasteiro.

2. Darem cobertura a um acto cobarde. Afirmando terem tomado em conta “o contexto” – o de uma pretensa e não declarada “emergência nacional” - , acompanharam a opção do governo: cumprir os compromissos assumidos com os credores internacionais; rasgar os compromissos assumidos com os trabalhadores (públicos e privados). Este acto, de submissão perante os fortes, e de imposição perante os fracos, é um acto de cobardia em qualquer lugar decente do mundo. Curiosamente (ou não!), lembraram-se de se esquecerem do outro lado do “contexto”, o lado humano, o das pessoas reais, as que assumiram compromissos dentro do seu orçamento familiar julgado assegurado por terem no Estado o exemplo de “pessoa de bem”, e que agora se vêem confrontados com incumprimentos que não são, de todo, da sua responsabilidade. Compromissos (empréstimos, p. ex.) esses que, enquanto cumpridos, constituíram fonte permanente de lucro para as empresas, sobretudo bancos, mas que, agora, constituem razões humanas para o suicídio.

3. Destruírem o que poderia restar da confiança nas instituições democráticas. Vejamos:

1. É, ou não, verdade, que os bancos, após obterem a recapitalização “necessária”, se lançaram, de novo, na especulação financeira – ainda por cima com a dívida pública do País! -, para já terem apresentado, com jactância medíocre e vergonhosa, as “mais-valias” obtidas com esta absoluta imoralidade?

2. É, ou não, verdade, que não muitos (e um só que fosse era já demais!) os que, obtidos “empréstimos” de muitos e muitos milhões de euros (BPN, BANIF, CGD) não os pagaram, nem pagam, e continuam a viver como se nada de mal ou errado tivessem feito?

3. É, ou não verdade, que quando alguém se “esquece” de declarar ao fisco ganhos de alguns milhões de euros é “premiado” com uma taxa de IRS enormemente reduzida quando “é lembrado” do que se “tinha esquecido”

4. É, ou não, verdade, que se tal acontecesse a um qualquer comum cidadão, seria imediatamente apontado como criminoso, os bens penhorados, a família despejada de casa?

5. É, ou não, verdade, que os contractos das Parcerias Público-Privadas não são tornados públicos, na sua totalidade? Porquê?

4. Ferirem gravemente a frágil democracia em que vivemos. Os membros do Tribunal Constitucional sabem:

1. Que a Assembleia da República – que deveria ser a Casa-Mãe da Democracia, aliando o Poder Legislativo ao exercício da fiscalização da acção governativa – se submeteu, desde há anos, ao Poder Executivo;

2. Que a “Justiça” é manifestamente selectiva;

3. Que os (poucos) poderes presidenciais foram colocados “entre aspas” quando, perante a opção entre vencimento inerente ao cargo e pensões de reforma, estas foram preferidas;

4. Que é legítimo questionarmo-nos sobre se a “inconstitucionalidade dos subsídios de férias e do natal” não terá sido a “moeda de troca” para o roubo apontado em 1. (Reconheço que não tenho os conhecimentos dos membros do Tribunal Constitucional, mas se me fosse apresentado um Orçamento de Estado contendo a mesma inconstitucionalidade do Orçamento anterior, sentir-me-ia insultado, pelo que a minha decisão seria imediata, o “chumbo total”, por não reconhecimento de tal documento! E estaria a ser brando!)

Perante o que fica exposto, poderia retirar-se uma conclusão: deixámos de viver em Democracia, por excesso de concentração de poderes no Poder Executivo.

Esta conclusão recebeu “forte apoio” através da reacção do governo à (branda!) decisão do Tribunal Constitucional, numa demonstração inequívoca de que quer “mandar sem peias, custe o que custar”

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